quarta-feira, 10 de junho de 2009

A invenção do beijo

A invenção do beijo

Numa época terciária e cenozóica a mulher de neanderthal (sim, não existia apenas o homem de Neanderthal), esfomeada, insatisfeita, infeliz, lamuriou-se através de grunhidos com seu parceiro, que atabalhoadamente decidiu sair à caça.
Ele, embrenhando-se na floresta deu de cara com um mamute de tamanho médio e com uma estaca em sua mão o enfrentou. Venceu com algum custo e soltou um berro primata e primário de algo parecido com alegria. Carregou com certa sofreguidão, em seu ombro arcado o pesado animal.
Passou pela lagoa, banhou-se e lavou a carcaça do futuro alimento... Foi por impulso que puxou com força a cabeça até arrancá-la do resto do corpo do bicho... Comeu frutos silvestres encontrados próximos e prosseguiu quebrando com violência os membros do mamute... O tempo era todo dele, não existia pressa, não existia calma. Não existia sentimento. Nem sei se existia algum raciocínio... Existia fome e a mulher tinha muita fome. O homem também, mas primitivamente a fome da mulher que repousava na caverna era para ele, mais importante. De uma importância estranha que ele também não entendia.
A carne do mamute foi o alimento de várias luas e de vários imprecisos instantes.
Os dois comiam lado a lado e ao cair da escuridão, deitados também lado a lado acabavam em dias frios esquentando um ao outro. Havia algo... Entretanto, nenhum dos dois compreendia.
E aconteceu que a carne do mamute chegou ao fim, sobrando um naco...
E o naco tinha uma aparência muito boa... Estava dando sopa na pedra polida no fundo da caverna. Os dois sem entenderem nada ficavam esperando um sinal qualquer... A mulher já naquele remoto tempo era mais criativa e tinha mais iniciativa e não perdeu a oportunidade que se apresentou... Pegou com rapidez o pedaço de carne e o colocou na boca iniciando a mastigação.
Instintivamente, eis que o que se deu foi inesperado, inusitado e incrível: o homem agarrou a cabeça da mulher com quase a mesma força com que arrancou a do mamute e foi em busca do naco de carne com sua boca na da mulher. Como a carne se encontrava já bem mastigada, ele enfiou a língua na boca dela e tentou resgatar a carne na boca da mulher.
As duas línguas se enlaçaram e se enfrentaram.
Ele conseguiu pegar alguns pedacinhos que procurou carregar consigo em sua língua. E se desvencilhando da boca dela sentiu um comichão estranho que não sabia o que era. A mulher, mais esperta, como sempre, já sabia e quis repetir devolvendo a ele com sua boca e língua, alguns outros pedacinhos de carne.
E então, aquilo se transformou numa prática diária. Passaram a ter o hábito de trocarem comida pela boca e ao dormirem a noite os corpos já não precisavam do frio para permanecer agarrados.
Ninguém sabia, mas estava inventado o beijo... E por tabela, o apetite.

Marco Antonio de Almeida

(Prof: Marquinho)


4 comentários:

  1. adoreiiiiiiiii professor.........

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  2. Escrevi esse texto que por muito tempo esteve como primeiro tópico no Google quando se digita "invenção do beijo" (agora está em segundo) levado pela necessidade de buscar explicação pra algo tão banal e necessário... Ao anônimo que considerou gay a reflexão de que talvez ele precise interpretar melhor o que ele mesmo sente a respeito das coisas...

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  3. muito legal professor gostei muito !!!!!!!!!!!!!!!!!!!

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